Há 65 anos, o presidente do Brasil, Getúlio Vargas, cometia suicídio no Palácio do Catete, no Rio de Janeiro, então capital federal.
Getúlio deixou uma carta testamento endereçada a todo povo brasileiro, cujo texto transcrevemos abaixo.
"Mais uma vez as forças e os interesses contra o povo coordenaram-se e
se desencadeiam sobre mim. Não me acusam, insultam; não me combatem,
caluniam; e não me dão o direito de defesa. Precisam sufocar a minha voz
e impedir a minha ação, para que eu não continue a defender, como
sempre defendi, o povo e principalmente os humildes.
Sigo o destino
que me é imposto. Depois de decênios de domínio e espoliação dos grupos
econômicos e financeiros internacionais, fiz-me chefe de uma revolução e
venci.
Iniciei o trabalho de libertação e instaurei o regime de
liberdade social. Tive de renunciar. Voltei ao governo nos braços do
povo.
A campanha subterrânea dos grupos internacionais aliou-se à
dos grupos nacionais revoltados contra o regime de garantia do trabalho.
A lei de lucros extraordinários foi detida no Congresso. Contra a
Justiça da revisão do salário mínimo se desencadearam os ódios.
Quis
criar a liberdade nacional na potencialização das nossas riquezas
através da Petrobras, mal começa esta a funcionar a onda de agitação se
avoluma. A Eletrobrás foi obstaculada até o desespero. Não querem que o
trabalhador seja livre,não querem que o povo seja independente.
Assumi o governo dentro da espiral inflacionária que destruía os valores
do trabalho. Os lucros das empresas estrangeiras alcançavam até 500% ao
ano. Nas declarações de valores do que importávamos existiam fraudes
constatadas de mais de 100 milhões de dólares por ano. Veio a crise do
café, valorizou-se nosso principal produto. Tentamos defender seu preço e
a resposta foi uma violenta pressão sobre a nossa economia a ponto de
sermos obrigados a ceder.
Tenho lutado mês a mês, dia a dia, hora a
hora, resistindo a uma pressão constante, incessante, tudo suportando em
silêncio, tudo esquecendo e renunciando a mim mesmo, para defender o
povo que agora se queda desamparado. Nada mais vos posso dar a não ser o
meu sangue. Se as aves de rapina querem o sangue de alguém, querem
continuar sugando o povo brasileiro, eu ofereço em holocausto a minha
vida.
Escolho este meio de estar sempre convosco. Quando vos
humilharem, sentireis minha alma sofrendo ao vosso lado. Quando a fome
bater à vossa porta, sentireis em vosso peito a energia para a luta por
vós e vossos filhos.
Quando vos vilipendiarem, sentireis no meu pensamento a força para a reação.
Meu sacrifício vos manterá unidos e meu nome será a vossa bandeira de
luta. Cada gota de meu sangue será uma chama imortal na vossa
consciência e manterá a vibração sagrada para a resistência. Ao ódio
respondo com perdão. E aos que pensam que me derrotam respondo com a
minha vitória. Era escravo do povo e hoje me liberto para a vida eterna.
Mas esse povo, de quem fui escravo, não mais será escravo de ninguém.
Meu sacrifício ficará para sempre em sua alma e meu sangue terá o preço do seu resgate.
Lutei contra a espoliação do Brasil. Lutei contra a espoliação do povo.
Tenho lutado de peito aberto. O ódio, as infâmias, a calúnia não
abateram meu ânimo. Eu vos dei a minha vida. Agora ofereço a minha
morte. Nada receio. Serenamente dou o primeiro passo no caminho da
eternidade e saio da vida para entrar na história."
Getúlio Dorneles Vargas.
24/08/1954
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