A criação de São Paulo está diretamente ligada
ao Peabiru. A pequena população de portugueses que já habitava a região
de São Vicente sabia pelos índios da existência do caminho que ia até
“montanhas cobertas de gelo” dominadas por um “Rei Branco” cheio de ouro
e prata (era Potosi, e o rei era Inca). Ao tomar conta disso, Martim
Afonso de Sousa achou pertinente criar ali uma base para futuras
explorações. Os jesuítas vieram na sequência, com planos bem diferentes
para aquelas entradas. Os religiosos sonhavam em usar estas trilhas como
eixo de expansão da catequese no interior da América do Sul e São Paulo
era uma dessas primeiras missões. O intercâmbio ao longo do que os
padres chamavam de “Caminho de São Tomé” era tão intenso que em 1560 o
governador geral do Brasil Mem de Sá decidiu proibir seu percurso, sob
forte protesto dos jesuítas, por medo da influência dos espanhóis que
faziam avanços ao longo de sua extensão. O fechamento precoce do caminho
é o maior desafio para se estabelecer sua localização, dependendo dos
poucos relatos contemporâneos.
Alguns historiadores acreditam que em certos trechos a trilha chegava a
ser pavimentada com pedra e documentos de época mencionam um caminho de
oito palmos de largura coberto por uma certa erva rasteira mágica que
resistia até o fogo e mantinha o contorno do caminho impedindo outras
plantas maiores de crescer no lugar. Outros, como Sérgio Buarque de
Holanda, sequer pensam que o Peabiru foi uma única via e sim um conjunto
de caminhos e instruções de movimentação pelo território sul-americano.
Independente de origem e aspecto, o Caminho do Peabiru partia de (ou
terminava em) Cusco, passava por Potosí, Assunção do Paraguai e na
região do Guayrá (interior do Paraná) se dividia em três ramais que
alçavam a costa Brasileira. O primeiro chegava em Santa Catarina,
próximo a Florianópolis, o do meio encontrava o mar em Cananéia e o mais
ao norte descia a Serra do Mar até se deparar com o mangue costeiro da
atual Cubatão.
Pouco se sabe sobre essas rotas, já que a história
oficial do Brasil até hoje é muito centrada nos feitos dos
colonizadores. Segundo o mito, os Bandeirantes teriam desbravado o
interior no país, até então selvagem e desconectado. Mas a verdade é
que, muito antes dos europeus chegarem aqui, já existia uma comunicação
transcontinental entre as diversas culturas ameríndias e o principal
duto dessa integração era o Peabiru. Nas últimas décadas tem havido um
esforço coletivo para tentar compreender a perspectiva indígena e
re-escrever a narrativa da ocupação do território americano. Nosso
projeto se junta a esse coro.
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