Shamm en-Nisīm, a segunda-feira de Páscoa copta, atravessou séculos, invasões, mudanças de regime e de religião, e até hoje todos os egípcios, independente de credo, cor ou origem festejam em todo o país.
É sabido que o Pesah, a Páscoa judaica, que deu origem à Páscoa cristã
tradicionalmente nasceu no Egito quando, como relata o Livro do Êxodo,
Deus teria ordenado a seu povo, ainda cativo no Egito, que ingerissem
pão não fermentado em sua refeição e marcassem a entrada de suas casas
com sangue de cordeiro, para que o Anjo da Morte enviado por Deus os
reconhecesse e poupasse seus primogênitos.
A Páscoa egípcia marca
o começo da estação das colheitas, o shemu ou shomu, daí o nome copta
shom ennisim. Ela é celebrada com consumo peixes defumados e
desidratados, lentilhas e, o principal: muita cebolinha asiática (Allium
fistulosum). O shemu marca a chegada do khamsin, o vento seco do
deserto, que traz muitas alergias e infecções respiratórias. O consumo
de cebola (conhecida por suas propriedades expectorantes e
bronco-dilatadoras) parece aliviar estes efeitos da chegada desta época.
Não parece ser à toa que fizesse parte da ração recebida pelos
trabalhadores na construção das pirâmides.
Pelo país inteiro o
odor das cebolas se dissemina nesta época desde aqueles dias do passado
mais distante. Por esta razão, os árabes, com a poesia típica de seu
idioma, rebatizaram o feriado de Shamm en-Nisīm, que significa “cheirar a
brisa” o que, na verdade, vem também da tradição egípcia, assinalada em
vários monumentos, estelas e inscrições, como um desejo embutido de
saúde e bem-aventurança, pela expressão “que aspires o delicioso sopro
do vento norte”. O vento norte, associado ao deus Shu, correspondia ao
próprio hálito da criação divina, emanado por Atum, o Criador, segundo a
teologia heliopolitana. Este hálito podia ser atribuído também a
Ptah-Tatenen, segundo a teologia menfita; por Khnum, segundo a teologia
do extremo sul; por Herishaef (“Harsafes”), segundo a teologia
heracleopolitana, e por Aten, segundo a reforma de Akhenaton. A intenção
era transformar um período que poderia ser visto como catastrófico,
como algo extremamente positivo, e totalmente inserido no plano divino.
Aparentemente, as pessoas de classes mais abastadas preferiam uma
referência direta com a divindade, pela utilização de botões de lótus,
símbolos de Atum e de Nefertum. A representação, nos afrescos de tumbas,
destas pessoas no Além, aspirando o odor de flores de lotus, as coloca
em contato com o Hálito de Vida do Criador, como se a vida ideal no
plano espiritual fosse um eterna Páscoa.
Feliz Páscoa a tod@s!
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