Jung afirma que a enfermidade de todos os seus pacientes na metanóia
está vinculada a perda do sagrado, podemos afirmar que se é possível
alguma saúde e qualidade de vida, sem a experiência contínua de ligação
com o sagrado, ela só é possível até a meia-idade, a partir dessa virada
de “volta para casa” é imprescindível que busquemos o sentido mais
profundo de nossa existência.
A filosofia, para Sêneca, é comparável à medicina, enquanto uma cura o corpo
a outra fornece os “remédios para a alma”. Assim podemos lembrar que o
maior terapeuta da alma de toda a história do pensamento existiu como um
grande filósofo, muito antes de a psicologia haver se constituído:
Sócrates. Esse grande sábio da Antiguidade, através da maiêutica levava
seus interlocutores a buscarem no mais profundo deles próprios, no Self,
a resposta para seus problemas e angústias. Como os órficos ensinavam: a
alma conhece todas as respostas é preciso treinar a consciência para
fazer-lhe as perguntas corretas.
Essa esfera numinosa que é nosso
Self corresponde ao atman hindu, é a centelha divina em cada um de nós.
Participa da essência do sagrado, é a particularização da totalidade
divina. Daí a importância do ensinamento órfico mais conhecido em toda a
história da filosofia: “Homem conhece-te a ti mesmo. E só então poderás
conhecer os deuses”. Aquele que quer participar da esfera mística e
sagrada, da plenitude conferida pelo numinoso, precisa antes
conhecer-se, o que não constitui tarefa fácil.
Nietzsche dizia que
era preciso inserir o risco em nossas vidas. Não o risco de
inconsequências, mas o de conhecer-se a si mesmo. Esse sim era o maior
de todos os riscos para a consciência, que em confronto com os conteúdos
sombrios do inconsciente poderia ter sua lucidez perdida. Dizia ainda
ser preciso dizer sim à vida. Quantas vezes adoecemos porque não dizemos
sim às nossas vidas? Dizia também que devíamos nos afastar dos fracos e
dos ressentidos para podermos nos tornar aristocratas, senhores de nós
mesmos, super-homens, livres e alados.
Essa atitude afirmativa,
alegre, que prenuncia uma alvorada é o ensinamento de Nietzsche, um
homem que sofreu dores e tormentos desde a infância e viveu os últimos
anos de sua vida com febres, dores e delírios em consequência da
encefalite herdada. Ainda assim nenhum filósofo superou-o na apologia a
vida que também era uma apologia à morte: “Muitos morrem demasiado tarde
e alguns, demasiado cedo. Ainda soa estranha a doutrina: ´Morre a
tempo!´
Morre a tempo: é o que ensina Zaratustra.
Sem dúvida,
quem nunca vive a tempo, como iria morrer a tempo? Antes não tivesse
nascido! – É assim que aconselho os supérfluos.
Mas também os supérfluos levam sua morte muito a sério e também a mais vazia das nozes quer ser quebrada.
Todos dão importância à morte; no entanto, ainda a morte não é uma
festa. Ainda os homens não aprenderam como se consagram as festas mais
bonitas.
Eu vos mostro a morte que aperfeiçoa que se torna, para o vivo, um aguilhão e uma promessa.
Da sua morte, morre o homem realizador de si mesmo; morre vitorioso,
rodeado de gente esperançosa a fazer auspiciosas promessas.
Seria mister aprender a morrer assim; e não deveria haver festa na qual um moribundo não consagrasse os juramentos dos vivos.”
O processo de individuação mostra que aquele que vivencia esse processo
morre como um vitorioso, porque realizou o si-mesmo, atingiu o seu mais
alto fim existencial. Sua morte deve ser celebrada, festejada por
aqueles que a tomarão como exemplo de realização e plenitude, porque ele
deixa a promessa de que é possível dizer sim a vida apesar da dor e do
sofrimento que possam acompanha-la.
E. Simone d. Magaldi, professora do IJEP
www.ijep.com.br
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